A trilha sonora composta pelo professor de contrabaixo do Conservatório Municipal de Guarulhos Ronaldo Gama e por seu irmão Renato Gama é parte do documentário musical Racionais: Das Ruas de São Paulo pro Mundo, longa metragem dirigido por Juliana Vicente disponível na Netflix que conta a trajetória do lendário grupo, um dos mais influentes do rap nacional.
Foto: Divulgação |
Em um mergulho sonoro pelo gênero, ao longo de quase duas horas é possível conhecer a origem e ascensão do grupo formado em 1988 por meio de entrevistas com os componentes Mano Brown, KL Jay, Ice Blue e Edi Rock e personagens que fizeram parte desse percurso.
O documentário reforça o impacto e o legado das músicas que introduziram o rap no país, desde os primeiros shows nas ruas de São Paulo.
Panteão da música brasileira
Ronaldo conta que ele e seu irmão sempre foram fãs do grupo, acompanharam sua trajetória e os lançamentos dos primeiros discos. Para os irmãos Gama, os Racionais MC’s sempre foram o panteão da música brasileira.
A produtora do documentário, Juliana Vicente, é fundadora da Preta Portê Filmes. Em 2016 ela e Renato se conheceram na Casulo, organização da sociedade civil que atua com crianças, adolescentes, jovens e famílias de comunidades na zona sul de São Paulo e oferece atividades socioeducativas, culturais, de educação para o trabalho e interação comunitária.
Na ocasião ela havia sido contratada para desenvolver um conteúdo institucional e emendou um convite para que Renato elaborasse a trilha do vídeo, música que recebeu o nome de Ornitorrinco. Desde então a parceria só cresceu e rendeu a trilha sonora de Afronta, série documental com 26 episódios sobre afrofuturismo e a juventude negra brasileira contemporânea, veiculada por streaming, entre outros trabalhos.
Em 2017 os irmãos Gama foram convidados por Juliana para compor a trilha de um vídeo comemorativo dos 25 anos dos Racionais MC’s. A proposta foi adiada por alguns anos, mas ganhou corpo e se tornou um documentário robusto com imagens da turnê de 30 anos e mais um acervo gigantesco dos integrantes com imagens antigas de shows do grupo.
Naquela época, há cinco anos, o estúdio dos irmãos Gama, o Pele Preta, localizado na Vila Nhocuné, na zona leste da Capital, ainda estava no começo, mas já nutria valiosa parceria com a cantora Adriana Moreira e o percussionista Jhony Guima, que também participaram da trilha.
Em uma das cenas do documentário, Ronaldo Gama aparece junto aos integrantes do grupo, às margens da represa Guarapiranga, tocando contrabaixo acústico, enquanto os integrantes contam como surgiram os Racionais.
“A intervenção foi muito interessante, eu fiquei ali tocando e ouvindo histórias potentes sobre as músicas que eles fizeram e a relação do grupo com o lugar onde nós estávamos”, conta Ronaldo. De volta ao estúdio, os irmãos Gama finalizaram outras partes essenciais da trilha sonora e que também integram o documentário.
Viver de arte
Em 2016 os Gama também produziram o álbum do dançarino de breaking, músico e ativista social Nelson Triunfo, um dos precursores do hip hop na rua São Bento, no centro de São Paulo. Em um dos shows de lançamento do álbum de Nelson, no Sesc Campo Limpo, Ronaldo e Renato convidaram Mano Brown e a participação do rapper foi regada a satisfação e alegria.
Sobre a importância dos Racionais MC’s para quem mora nas periferias de São Paulo, Ronaldo observa que suas músicas sempre foram um farol das comunidades pobres por meio de temas como violência e crime.
“Os Racionais nos deram a possibilidade de transformar nossa arte em algo mais concreto. A periferia sempre produziu arte e precisávamos de pessoas que desbravassem esse mato alto, essa ligação entre a periferia e os grandes centros urbanos. Com um discurso antissistema, os Racionais quebraram essa barreira num período em que o hip hop ainda não tinha toda essa força e não era aceito pela grande mídia. O grupo também quebrou o paradigma de que nós, artistas da periferia, precisávamos nos integrar ao sistema para sobreviver de arte”, explica Ronaldo.
Solo fértil em Guarulhos
Como músico, Ronaldo sempre esteve envolvido na relação entre palco e instrumento. Ele conta que gosta mesmo é de tocar contrabaixo. Sua atuação como coordenador do coletivo Estudando o Samba e professor de contrabaixo elétrico e acústico populares no Conservatório Municipal de Guarulhos tem subsidiado sua formação como músico, considerando que ao ensinar ele também aprende com seus alunos.
Ronaldo já havia lecionado no projeto Guri e na Fundação Gol de Letra antes de iniciar sua trajetória no Conservatório de Guarulhos, em 2015. Nessa época, o curso de contrabaixo foi um dos que passaram a ser oferecido pela instituição para popularizar a oferta da casa.
“No Conservatório de Guarulhos eu encontrei terreno fértil para fomentar as possibilidades da música popular brasileira, a partir regras que não estão pré-estabelecidas como na música erudita. Sua contemporaneidade faz com que a música popular seja um campo sempre em desenvolvimento, e isso fez com que eu tivesse os ouvidos muito abertos para suas manifestações, em especial as dos jovens, o que me levou a entender movimentos mais recentes como o hip hop e o trap para introduzir diálogos sobre questões estilísticas”, conta.
Satisfeito em trabalhar com a música popular de forma autônoma e livre, Ronaldo vibra com a possibilidade de poder ir o mais longe que pode, com acertos, erros e replanejamento e respeito ao que os alunos ouvem.
Serviço
O Conservatório Municipal de Guarulhos fica na rua Abílio Ramos, 122, Macedo. Para mais informações sobre a oferta de cursos entre em contato pelo telefone (11) 2087-7440.
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